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quinta-feira, 2 de junho de 2016

LICENCIAMENTO AMBIENTAL:

PEC 65/2012 pode aumentar prejuízos para o meio ambiente e empreendedores:


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Crédito: Pixabay
Por Letícia Yumi Marques
Especialista em Direito Ambiental da Lee, Brock, Camargo Advogados (LBCA), profa. da PUC-SP e membro da Comissão de Infraestrutura, Logística e Desenvolvimento Sustentável da OAB-SP
A PEC n. 65/2012, que pretende alterar o rito do licenciamento ambiental, passando a  autorizar a execução da obra a partir da entrega do estudo prévio de impacto ambiental,  pode ser considerada medida temerária do ponto de vista da preservação ambiental e da segurança jurídica.


Pronta para ser deliberada em plenário após aprovação, no último mês de abril, pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania – CCJ do Senado Federal, a PEC 65/2012 pretende acrescentar um parágrafo ao artigo 225 da Constituição Federal, fazendo com que a simples apresentação do estudo prévio de impacto ambiental acarrete  em autorização para início da construção, que não poderia ser suspensa ou cancelada, salvo na hipótese de fato superveniente.

Na verdade, o estudo de impacto ambiental é instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81) e está previsto no próprio texto constitucional (art. 225, §1º, IV), como exigência para instalação de obras potencialmente poluidoras. É a partir da análise dos dados do estudo que o órgão ambiental avalia os possíveis impactos da obra e estabelece restrições e medidas mitigadoras ou compensatórias, que devem ser atendidas pelo empreendedor na execução da obra e da atividade. A PEC 65/2012 pode ser viabilizada com base no inciso em questão, que estabelece a exigência do estudo, mas não diz o óbvio: que o estudo deve ser apresentado antes da instalação da obra.

De acordo com a justificação da PEC, de autoria do Senador Acir Gurcacz (PDT/RO), a proposta objetiva evitar a ineficiência pública consistente “nas obras inacabadas ou nas obras ou ações que se iniciam e são a seguir interrompidas mediante decisão judicial de natureza cautelar ou liminar, resultantes, muitas vezes, de ações judiciais protelatórias”.

Essa justificativa é, de fato, uma realidade em várias regiões do país e são favorecidas pela ineficiência de alguns órgãos ambientais, que muitas vezes não dispõem de recursos humanos e materiais para sua atividade reguladora e fiscalizadora. Todavia, a suposta celeridade na garantia de início de obras a partir da mera entrega do estudo de impacto ambiental, antes mesmo de sua análise pelo órgão ambiental, é temerária; pois os impactos a serem identificados a partir da análise do estudo podem ser considerados fatos supervenientes, capazes de paralisar a obra com fundamento nos Princípios da Prevenção e da Precaução, o que pode causar prejuízos para o empreendedor.

Isto porque é a partir da análise do estudo que o órgão ambiental estipula as medidas mitigadoras e compensatórias que serão exigidas do empreendedor, favorecendo um controle de orçamento e cronograma mais adequados. Geralmente, a análise do estudo pelo órgão ambiental não ocorre dentro do prazo legal e a demora na concessão das licenças ambientais é um dos mais graves entraves à implementação de empreendimentos; contudo, antecipar etapas do licenciamento, permitindo a execução da obra antes da definição das medidas mitigadoras e compensatórias pode impactar negativamente na implementação do empreendimento.

A falta de rigor técnico na terminologia empregada no texto também é um provável fator de controvérsia. De acordo com a PEC, “A apresentação do estudo prévio de impacto ambiental importa autorização para a execução da obra, que não poderá ser suspensa ou cancelada pelas mesmas razões a não ser em face de fato superveniente”. O termo “autorização”, no entanto, define o ato administrativo de caráter precário e unilateral, que pode ser revogado pelo órgão ambiental de forma discricionária. Em outras palavras, como está redigida, a proposta é contraditória, já que, por definição, uma “autorização” não é instrumento apto a gerar direito de não suspensão da obra como pretendido pela PEC.

Outro ponto controverso contido na justificação da PEC diz respeito à “perda de tempo” relacionado a esses procedimentos, nos quais “desperdiçam-se recursos públicos vultuosos, em flagrante desrespeito à vontade da população”. Sobre o tema, vale esclarecer que, se há atraso e abandono de obras, o fator determinante para a paralisação certamente está mais relacionado à falta de estrutura e recursos humanos dos órgãos e à corrupção e desvio de verbas de entes políticos do que ao estudo ambiental em si.

A justificação da PEC 65/2012 ainda parece reduzir a problemática do licenciamento ambiental a uma questão política: “Um chefe de Poder Executivo, como um prefeito, tem quatro anos de mandato. (…) muitas vezes chega a iniciar a obra, mas a conclusão é frustrada por uma decisão judicial que, não raro, resulta da inquietude da oposição diante dos possíveis efeitos positivos, junto à cidadania, de uma dada obra pública”.

Faz parte do jogo democrático que obras públicas executadas por concessionárias privadas sejam objeto de críticas dos partidos oposicionistas ao Poder Executivo, que as contrata de acordo com suas políticas de desenvolvimento urbano e de infraestrutura. Porém, o licenciamento ambiental dessas obras é um procedimento complexo, multidisciplinar e que envolve a atuação de biólogos, engenheiros, antropólogos, arqueólogos e diversos outros profissionais que convergem esforços para o necessário equilíbrio entre desenvolvimento e preservação ambiental. É preciso que o Congresso Nacional compreenda que a natureza não se submete à política e que a segurança jurídica necessária para investimentos em infraestrutura não deve ficar à mercê de medidas temerárias.

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