Os princípios são construções teóricas que procuram desenvolver uma base comum, dando ao sistema jurídico um sentido harmônico, racional e coerente.
Em sede de Direito Ambiental, os princípios carregam grande importância, uma vez que a produção da norma ambiental é dotada de uma complexidade específica (ANTUNES, 2014, p. 21), o que acarreta na perda de sua abstração e generalidade. Logo, as matérias que ainda não foram objetos de legislação específica são tratadas pelo Poder Judiciário sob a ótica dos princípios.
1. Princípio do meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental da pessoa humana
O legislador constituinte, além de elencar direitos e deveres individuais e coletivos no art. 5º, inseriu no caput do artigo 225, um novo direito fundamental da pessoa humana, referente ao gozo de condições de vida adequada em um ambiente sadio.
Esse novo direito fundamental, reconhecido pela Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano de 1972 (Princípio 1), reafirmado pela Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992 (Princípio 1) e pela Carta da Terra de 1997 (Princípio 4), tem conquistando espaço nas constituições mais modernas, como, por exemplo, as de Portugal, de 1976, e Espanha, de 1978 (MILARÉ, 2011, p. 1065).
Vejamos o teor dos dispositivos supramencionados:
1. O homem é ao mesmo tempo obra e construtor do meio ambiente que o cerca, o qual lhe dá sustento material e lhe oferece oportunidade para desenvolver-se intelectual, moral, social e espiritualmente. Em larga e tortuosa evolução da raça humana neste planeta chegou-se a uma etapa em que, graças à rápida aceleração da ciência e da tecnologia, o homem adquiriu o poder de transformar, de inúmeras maneiras e em uma escala sem precedentes, tudo que o cerca. Os dois aspectos do meio ambiente humano, o natural e o artificial, são essenciais para o bem-estar do homem e para o gozo dos direitos humanos fundamentais, inclusive o direito à vida mesma. (Princípio 1º da Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano de 1972)
Os seres humanos estão no centro das preocupações com o desenvolvimento sustentável. Têm direito a uma vida saudável e produtiva, em harmonia com a natureza. (Princípio 1º da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1922).
4. Garantir as dádivas e a beleza da Terra para as atuais e as futuras gerações.
a) Reconhecer que a liberdade de ação de cada geração é condicionada pelas necessidades das gerações futuras.
b) Transmitir às futuras gerações valores, tradições e instituições que apóiem, em longo prazo, a prosperidade das comunidades humanas e ecológicas da Terra. (Princípio 4º da Carta da Terra de 1997)
É salutar dizer que reconhecimento do direito a um meio ambiente são se caracteriza como extensão do direito à vida, seja sob o enfoque da existência física e saúde dos seres humanos, seja sob o aspecto da dignidade de tal existência, qual seja, a qualidade de vida.
Para Antônio Cançado Trindade (1993, p. 75),
o caráter fundamental do direito à vida torna inadequados enfoques restritos do mesmo em nossos dias; sob o direito à vida, em seu sentido próprio e moderno, não só se mantém a proteção contra qualquer privação arbitrária da vida, mas, além disso, encontram-se os Estados no dever de buscar diretrizes destinadas a assegurar o acesso aos meios de sobrevivência a todos os indivíduos e todos os povos. Neste propósito, tem os Estados a obrigação de evitar riscos ambientais sérios à vida.
O princípio do ambiente ecologicamente equilibrado transcende todo o ordenamento jurídico ambiental, ostentando caráter de verdadeira cláusula pétrea, nos ditames do artigo
60,
§ 4º,
IV, da
Constituição Federal.
2. Princípio da função socioambiental da propriedade
Embora o direito à propriedade seja concebido como direito fundamental (artigo
5º,
XXII,
CF/88), o seu exercício não pode ser entendido como ilimitado ou absoluto. O legislador constituinte, nos artigos
5º,
XXIII,
170,
III e
VI, da
Constituição Federal, condiciona, claramente, o uso da propriedade ao bem estar social.
Atualmente, a propriedade não apresenta mais a concepção individualista presente no
Código Civil de 1916. O referido código tratava o direito à propriedade de modo inteiramente individual, incumbindo ao Estado, tão somente, a função de assegurar os meios necessários para que o proprietário garantisse a manutenção e o caráter de perpetuidade de sua propriedade (MACEDO, p. 108).
Com o advento do
Código Civil de 2002, a função social da propriedade teve enorme destaque, em clara consonância com o
texto constitucionalvigente. A partir de tais disposições legais, nasce para o proprietário o dever de imprimir ao bem uma função social, havendo, de certo modo, prevalência dos valores coletivos sobre os individuais.
O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.
Para Carvalho (1997, p. 217), sob a ótica do novo paradigma inserido pela Constituição Federal de 1998, “a propriedade, sem deixar de ser privada, se socializou, com isso significando que deve oferecer à coletividade uma maior utilidade, dentro da concepção de que o social orienta o individual”.
Há de se ressaltar que a função social existe tanto para a propriedade urbana, quanto para a rural. A
Constituição Federal de 1988 estabeleceu, em seu artigo
182,
§ 2º, que “a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor”.
Lado outro, a função social da propriedade rural vem elencada no artigo
186 da
Carta Maior, qual seja:
Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:
I - aproveitamento racional e adequado;
II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
Vale dizer que, antes mesmo da vigência da
Constituição Federal de 1988, O
Estatuto da Terra (Lei nº
4.504/1964) já estabelecia, em seu artigo
2º,
§ 1º, determinados requisitos para a configuração da função social da propriedade rural, dentre eles, o mais importante para o assunto em tela, o constante da alínea c, que versa sobre a conservação dos recursos naturais.
Dessa feita, é salutar afirmar que o princípio da função socioambiental da propriedade não se restringe a limitar o exercício da propriedade, sob a noção de que ao proprietário é permitido tudo que não prejudique o meio ambiente ou a coletividade. Para Mirra citado por Milaré (2011, p. 1079) “a função social e ambiental vai mais longe e autoriza até que se imponha ao proprietário comportamentos positivos, no exercício de seu direito, para que sua propriedade concretamente se adeque à preservação do meio ambiente”.
3. Princípio da solidariedade intergeracional
Conforme preceitua o artigo
225,
caput, da
Constituição Federal de 1988, compete à coletividade e ao Poder Público o dever de preservar o meio ambiente "para as presentes e futuras gerações." Em linhas gerais, a solidariedade intergeracional consiste em preservar o meio ambiente para que as próximas gerações possam usufruir dos recursos naturais do planeta.
Segundo a doutrina ambientalista, a solidariedade abriga duas espécies: sincrônica e diacrônica. A solidariedade sincrônica diz respeito às relações entre as gerações presentes. Já a diacrônica remete à solidariedade com gerações que ainda hão de vir. Conforme preceitua Milaré (2011, p. 1066), há uma preferência em usar o termo solidariedade intergeracional, "porque traduz os vínculos solidários entre as gerações presentes e com as gerações futuras".
É importante ressaltar que, em 1972, a Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano já havia disposto, em seus Princípios 2 e 5, acerca da preservação ambiental para as futuras gerações.
Princípio 2 - Os recursos naturais da Terra, incluídos o ar, a água, o solo, a flora e a fauna e, especialmente, parcelas representativas dos ecossistemas naturais, devem ser preservados em benefício das gerações atuais e futuras, mediante um cuidadoso planejamento ou administração adequada.
Princípio 5 - Os recursos não renováveis da Terra devem ser utilizados de forma a evitar o perigo do seu esgotamento futuro e a assegurar que toda a humanidade participe dos benefícios de tal uso.
Já em 1992, a Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento ratificou a importância da solidariedade intergeracional, eis que seu princípio 3 dispõe o seguinte: "O direito ao desenvolvimento deve exercer-se de forma tal que responda equitativamente às necessidades de desenvolvimento e ambientais das gerações presentes e futuras”.
Em decisão sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal reconheceu o caráter intergeracional do direito ao meio ambiente e sua inserção nos direitos humanos. Vejamos um trecho da ementa do julgado:
[...] A questão do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado - Direito de terceira geração - Princípio da Solidariedade. O direito à integridade do meio ambiente – típico de terceira geração – constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação dos direitos humanos, a expressão significativa de um poder atribuído, não ao indivíduo identificado em sua singularidade, mas, num sentido verdadeiramente mais abrangente, à própria coletividade social. Enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) – que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais – realçam o princípio da liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) – que se identificam com as liberdades positivas, reais ou concretas – acentuam o princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade. (MS 22164, Relator (a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 30/10/1995, DJ 17-11-1995 PP-39206 EMENT VOL-01809-05 PP-01155).
Noutro giro Beltrão (2009, p. 55) reconhece o planejamento racional como mecanismo essencial à efetivação solidariedade intergeracional. O planejamento racional se faz tão importante para o princípio da solidariedade intergeracional, uma vez que visa conciliar o desenvolvimento e a sustentabilidade. Nesse sentido, é possível destacar o teor dos princípios 14 e 15 da Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano:
Princípio 14. O planejamento racional constitui um instrumento indispensável para conciliar às diferenças que possam surgir entre as exigências do desenvolvimento e a necessidade de proteger e melhorar o meio ambiente.
Princípio 15. Deve-se aplicar o planejamento aos assentamentos humanos e à urbanização com vistas a evitar repercussões prejudiciais sobre o meio ambiente e a obter os máximos benefícios sociais, econômicos e ambientais para todos. A este respeito devem-se abandonar os projetos destinados à dominação colonialista e racista.
Nesta esteira, em âmbito nacional, a Lei nº
6.938/1981 prevê, em seu artigo
2º, tanto a"racionalização do uso do solo, do subsolo, da água e do ar” (inciso II), quanto o"planejamento e fiscalização do uso dos recursos ambientais" (inciso III), como princípios orientadores da Política Nacional para o Meio Ambiente.
Nota-se, portanto, a enorme relevância do Princípio da Solidariedade Intergeracional dentro da legislação brasileira, eis que se ocupa de garantir a efetivação de um direito difuso pertencente às presentes e futuras gerações, qual seja, a fruição de um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
4. Princípio da prevenção e princípio da precaução
Embora intimamente relacionados, os princípios da prevenção e da precaução não se confundem. Segundo Antunes (2014, p. 48) aplica-se o princípio da prevenção “a impactos ambientais já conhecidos e dos quais se possa, com segurança, estabelecer um conjunto de nexos de causalidade que seja suficiente para a identificação dos impactos futuros prováveis”.
Seguindo tal sentido, o legislador inseriu expressamente o princípio da prevenção no
texto constitucional, especialmente no artigo
225, quando impõe ao Poder Público e a toda coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações.
Levando-se em conta que o dano ambiental comumente é irreversível, para Rodrigues, deve-se entender “proteção” não somente no sentido reparatório, mas especialmente no sentido preventivo (2010, p. 32). A atenção do Direito Ambiental está voltada para o momento anterior à consumação do dano – o do mero risco. Isto porque entre a prevenção e a reparação, a prevenção sempre será de maior relevância, sendo em alguns casos, a única solução para o dano ambiental.
Existem diversos instrumentos de tutela ambiental de extrema importância. Na seara administrativa é possível citar o licenciamento ambiental, o zoneamento urbano (previsto na Lei nº
6.803/1980), o tombamento administrativo, as sanções administrativas de interdição de atividades, o manejo ecológico, as auditorias ambientais, a gestão ambiental, entre outros. Já em âmbito jurisdicional é importante destacar os instrumentos de tutela de urgência (liminares antecipatórias e medidas cautelares), bem como a ação civil pública e a ação popular (RODRIGUES, 2010, p. 33).
Em linhas iniciais, o princípio da precaução se constitui no principal norteador das políticas ambientais, eis que tem por fundamento de evitar os riscos potenciais e a ocorrência dos danos ambientais ainda não identificados. Consoante o nobre ambientalista Édis Milaré (2011, p. 1071), a aplicação de tal princípio deve se dar "quando a informação científica é insuficiente, inconclusiva ou incerta e haja indicações de que os possíveis efeitos sobre o ambiente, a saúde das pessoas ou dos animais ou a proteção vegetal possam ser potencialmente perigosos e incompatíveis com o nível de proteção escolhido".
O princípio da precaução restou consagrado no Direito Ambiental a partir de dois documentos internacionais: a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento e a Convenção sobre a Mudança do Clima, ambas de 1992. Vejamos:
Princípio 15. Com o fim de proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deverá ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos graves ou irreversíveis, a ausência de certeza científica absoluta não será utilizada como razão para o adiamento de medidas economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental. (Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1922)
Artigo 3º, 3. As Partes devem adotar medidas de precaução para prever, evitar ou minimizar as causas da mudança do clima e mitigar seus efeitos negativos. Quando surgirem ameaças de danos sérios ou irreversíveis, a falta de plena certeza científica não deve ser usada como razão para postergar essas medidas, levando em conta que as políticas e medidas adotadas para enfrentar a mudança do clima devem ser eficazes em função dos custos, de modo a assegurar benefícios mundiais ao menor custo possível. Para esse fim, essas políticas e medidas devem levar em conta os diferentes contextos socioeconômicos, ser abrangentes, cobrir todas as fontes, sumidouros e reservatórios significativos de gases de efeito estufa e adaptações, e abranger todos os setores econômicos. As Partes interessadas podem realizar esforços, em cooperação, para enfrentar a mudança do clima. (Convenção sobre a Mudança do Clima).
Nesse mesmo sentido, a Carta da Terra de 1997, em seu princípio 6º, adotou o princípio da precaução, dispondo que:
6. Prevenir o dano ao ambiente como o melhor método de proteção ambiental e, quando o conhecimento for limitado, assumir uma postura de precaução.
a. Orientar ações para evitar a possibilidade de sérios ou irreversíveis danos ambientais mesmo quando a informação científica for incompleta ou não conclusiva.
b. Impor o ônus da prova àqueles que afirmarem que a atividade proposta não causará dano significativo e fazer com que os grupos sejam responsabilizados pelo dano ambiental.
c. Garantir que a decisão a ser tomada se oriente pelas conseqüências humanas globais, cumulativas, de longo prazo, indiretas e de longo alcance.
d. Impedir a poluição de qualquer parte do meio ambiente e não permitir o aumento de substâncias radioativas, tóxicas ou outras substâncias perigosas.
e. Evitar que atividades militares causem dano ao meio ambiente.
Noutro lado, o princípio da precaução encontra-se claramente disposto na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº
6.938/1981), em especial no artigo 4º, incisos I e IV, que expressa a imprescindibilidade do equilíbrio entre o desenvolvimento socioeconômico, o desenvolvimento científico, a preservação do meio ambiente e o uso racional dos recursos naturais.
Insta salientar que o princípio da precaução também está inserido timidamente no
texto constitucional, eis que o artigo
225,
§ 1º, inciso, dispõe que cabe ao Poder Público o controle da produção, comercialização e emprego de técnicas, métodos e substâncias que impliquem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente.
Há de se ressaltar também a previsão do princípio da precaução tanto na Lei dos Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1995) quanto na Lei da Biossegurança (Lei nº
11.105/2005). A
Lei de Crimes Ambientais, em seu artigo
54,
§ 3º tipifica a omissão na adoção de medidas de precaução, no caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível, prevendo a pena de reclusão, de um a cinco anos. Já a
Lei de Biosseguranca menciona, no artigo
1º,
caput, o princípio ora analisado, ao dispor como diretrizes "diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente".
5. Princípio do poluidor-pagador e princípio do usuário-pagador
O princípio do poluidor-pagador encontra-se expressamente elencado no artigo
225,
§ 3º, da
Constituição Federal de 1988, o qual estabelece que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.
Tal princípio se originou da ideia de que a carga econômica da tutela do meio ambiente deveria recair sobre o poluidor, e não sobre os demais contribuintes. Foi formulado inicialmente pela Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico da Europa, em 1972, e foi ratificado pela Declaração do Rio, de 1992, em seu Princípio 16. (FREITAS, 2005, p. 43).
Princípio 16. As autoridades nacionais devem procurar promover a internacionalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, tendo em vista a abordagem segundo a qual o poluidor deve, em princípio, arcar com o custo da poluição, com a devida atenção ao interesse público e sem provocar distorções no comércio e nos investimentos internacionais.
Para Édis Milaré, o princípio do poluidor-pagador assenta-se na vocação redistributiva do Direito Ambiental, inspirando-se na teoria econômica de que os custos sociais externos que acompanham o processo produtivo precisam ser internalizados, vale dizer, que os agentes econômicos devem levá-los em conta ao elaborar os custos de produção e assumi-los. (2011, p. 1074).
Noutra quadra, a
Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº
6.938/1981), inseriu o princípio do poluidor-pagador na legislação pátria ao dispor em seu artigo
4º,
VII, como um de seus fins “a imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados”. Ademais, a
Constituição Federal preceitua, em seu artigo
225,
§ 3º, que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.
Já o princípio do usuário-pagador, tido pela doutrina ambientalista como princípio complementar do princípio do poluidor-pagador, busca evitar “que o ‘custo zero’ dos serviços e recursos naturais acabe por conduzir o sistema de mercado de hiperexploração do meio ambiente” (MUSETTI citado por MILARÉ, 2011, p. 1076).
A Lei
6.938/1981, ao dispor sobre as obrigações do poluidor, foi além, e incluiu também o usuário, impondo a este uma “contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos” (artigo 4º, VII).
Há de se ressaltar também o teor do artigo
36 da Lei nº
9.985/2000, que preceitua que “nos casos de licenciamento ambiental de empreendimentos de significativo impacto ambiental, assim considerado pelo órgão ambiental competente, com fundamento em estudo de impacto ambiental e respectivo relatório - EIA/RIMA, o empreendedor é obrigado a apoiar a implantação e manutenção de unidade de conservação do Grupo de Proteção Integral [...]”.
Acerca do dispositivo supramencionado, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que:
[...] 3. O art.
36 da Lei nº
9.985/2000 densifica o princípio usuário-pagador, este a significar um mecanismo de assunção partilhada da responsabilidade social pelos custos ambientais derivados da atividade econômica. 4. Inexistente desrespeito ao postulado da razoabilidade. Compensação ambiental que se revela como instrumento adequado à defesa e preservação do meio ambiente para as presentes e futuras gerações, não havendo outro meio eficaz para atingir essa finalidade constitucional. Medida amplamente compensada pelos benefícios que sempre resultam de um meio ambiente ecologicamente garantido em sua higidez. [...] (STF - ADI: 3378 DF, Relator: Min. CARLOS BRITTO, Data de Julgamento: 09/04/2008, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-112 DIVULG 19-06-2008 PUBLIC 20-06-2008 EMENT VOL-02324-02 PP-00242 RTJ VOL-00206-03 PP-00993)
6. Princípio da participação e princípio da informação
O princípio ambiental da participação trata do direito da sociedade de participar de questões ambientais. Decorre especialmente da disposição constitucional (artigo 225, caput, Constituição Federal de 1988) que impõe à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações.
Paulo de Bessa Antunes (2014, p. 27), denomina o princípio da participação por princípio democrático, sendo aquele que:
assegura aos cidadãos, o direito de, na forma da lei ou regulamento, participar das discussões para a elaboração das políticas públicas ambientais e de obter informações dos órgãos públicos sobre matéria referente à defesa do meio ambiente e de empreendimento utilizadores de recursos ambientais e que tenham significativas repercussões sobre o ambiente, resguardado o sigilo industrial.
Lado outro, Paulo Affonso Leme Machado (1999, p. 74) compreende o princípio da participação de quatro formas, quais sejam, a participação na formação das decisões administrativas, a participação nos recursos administrativos e nos julgamentos administrativos, a participação legislativa direta (através da instituição do plebiscito ou referendo ambiental) e a participação nas ações judiciais.
Cumpre dizer que o princípio da participação tem previsão expressa na Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992. Acerca do princípio da participação, o Princípio 10 dispõe que "a melhor maneira de tratar as questões ambientais é assegurar a participação, no nível apropriado, de todos os cidadãos interessados [...]".
Logo, nota-se que, por meio do princípio da participação, a sociedade assume uma postura ativa, se tornando coadjuvante no processo de preservação do meio ambiente. Tal princípio é de extrema relevância, eis que consubstancia o envolvimento de todas as parcelas da sociedade nas questões ambientais. É possível afirmar, ainda, que o princípio da participação é corolário do princípio da informação, eis que uma sociedade somente será atuante se tiver acesso adequado às informações pertinentes a assuntos ambientais.
O princípio da informação pode ser entendido como o direito de ter acesso a determinadas informações. Para Machado (2006, p. 260), consiste, seguramente, em um dos fundamentos de um regime democrático, impondo transparência e moralidade aos atos da administração pública.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu artigo XIX, dispõe que "Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras".
Outrossim, a Declaração do Meio Ambiente de Estocolmo, 1972, também versa sobre a importância da educação ambiental, em seu Princípio 19:
É indispensável um esforço para a educação em questões ambientais, dirigida tanto às gerações jovens como aos adultos e que preste a devida atenção ao setor da população menos privilegiado, para fundamentar as bases de uma opinião pública bem informada, e de uma conduta dos indivíduos, das empresas e das coletividades inspirada no sentido de sua responsabilidade sobre a proteção e melhoramento do meio ambiente em toda sua dimensão humana. É igualmente essencial que os meios de comunicação de massas evitem contribuir para a deterioração do meio ambiente humano e, ao contrário, difundam informação de caráter educativo sobre a necessidade de protegê-lo e melhorá-lo, a fim de que o homem possa desenvolver-se em todos os aspectos.
O supramencionado princípio 10 da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992 também dispõe sobre o princípio da informação. Vejamos:
No nível nacional, cada indivíduo terá acesso adequado às informações relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades públicas, inclusive informações acerca de materiais e atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar dos processos decisórios. Os Estados irão facilitar e estimular a conscientização e a participação popular, colocando as informações à disposição de todos. Será proporcionado o acesso efetivo a mecanismos judiciais e administrativos, inclusive no que se refere à compensação e reparação de danos.
Segundo Beltrão (2009, p. 41), a Convenção sobre Informação, Participação Pública na Tomada de Decisões e Acesso à Justiça em Matéria Ambiental de 1998, no artigo 6 (d) (2) prevê que "o público afetado deve ser informado, tanto através de avisos públicos quanto individualmente quando apropriado, no início de um procedimento de tomada de decisão em matéria ambiental, e de uma forma adequada, oportuna, efetiva... Incluindo como e quanto esta informação pode ser dada: (i) o início do procedimento; (ii) as oportunidades para participação do público".
Tais documentos internacionais reafirmam a ideia de que existe uma ligação entre o meio ambiente e o direito de ser informado. Segundo Machado (2010), a informação serve para o processo de educação de cada pessoa e da comunidade, os dados ambientais devem ser publicados atendendo a um principio maior, o da democracia.
No Brasil, o acesso à informação, em linhas gerais, consiste em um dos direitos e garantias fundamentais previstos na
Carta Maior, em seu artigo
5º, inciso
XIV. Lado outro o inciso XXXIII do mesmo artigo dispõe que "todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado".
Há de se ressaltar ainda o teor do inciso XXXIV, que prevê a garantia do direito de petição aos poderes públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder, e ainda a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimentos de situações de interesse pessoal, independente do pagamento de taxas.
Além dos dispositivos constitucionais supracitados, o acesso à informação encontra-se disposto também nos artigos
37,
§ 3º,
II e
216,
§ 2º, da
Constituição Federal, todos regulamentados pela Lei nº
12.257/2011. Tal lei dispõe acerca dos procedimentos a serem observados pelos entes federativos, com o fim de garantir o direito de acesso à informação.
Já no âmbito notadamente ambiental, é possível perceber que o princípio da informação reside no
texto constitucional de forma implícita. A legislação pátria estatui, no artigo
225,
§ 1º,
VI, da
Constituição Federal, que incumbe ao Poder Público "promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente". Já em seu inciso IV, estabelece que se deve dar publicidade ao Estudo de Impacto Ambiental elaborado para instalação de obra e/ou atividade potencialmente degradadora.
Infraconstitucionalmente, o princípio ambiental da informação encontra guarida nas inúmeras disposições da Lei nº
6.938/81. Em seu artigo 2º, X, a referida lei prevê que a educação ambiental configura como princípio norteador da Política Nacional do Meio Ambiente.
Ademais, em seu artigo
4º,
V, a Lei nº
6.938/1981 dispõe como um de seus objetivos "difusão de tecnologias de manejo do meio ambiente, à divulgação de dados e informações ambientais e à formação de uma consciência pública sobre a necessidade de preservação da qualidade ambiental e do equilíbrio ecológico
".
Já no artigo 9º, VII e XI, a lei estabelece como instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente o "o sistema nacional de informações sobre o meio ambiente" e "a garantia da prestação de informações relativas ao Meio Ambiente, obrigando-se o Poder Público a produzi-las, quando inexistentes".
Noutro giro, há de se destacar a Lei nº
10.650/2003 que dispõe sobre o acesso público aos dados e informações existentes nos órgãos e entidades integrantes do SISNAMA. Em seu artigo 2º, tal lei obriga que todos os órgãos e entidades da Administração Pública, direta, indireta e fundacional, integrantes do Sisnama, permitam o acesso público aos documentos, expedientes e processos administrativos que tratem de matéria ambiental, fornecendo todas as informações ambientais que estejam sob sua guarda.
Logo, verifica-se que tanto o princípio da participação quanto o da informação encontram-se fortemente alicerçados no Direito Ambiental Brasileiro, embora ainda exista um enorme caminho a percorrer no que tange à divulgação de informações sobre matéria ambiental, bem como educação e participação da coletividade.
[Trecho do artigo intitulado Responsabilidade Civil Ambiental, de autoria Lívia Maria Dias Andrade].